"Quando um terço ou metade da população desaparece subitamente, as consequências sociais e psicológicas são gigantescas. Os que permanecem são muito numerosos para repartir o bolo, as heranças, as fortunas. A epidemia determinou uma elevação geral do nível de vida. Ela livrou a Europa de um aumento de população. [...]. Na minha opinião, é no campo cultural que as repercussões do choque são mais visíveis. O macabro instala-se na literatura e na arte. Propagam-se imagens trágicas, o tema do esqueleto, da dança macabra. A morte está em toda parte."
DUBY, George. 1999. p 86-87.
O termo Idade Média nasceu no século XVI, no momento em que a Europa passava por um grande desenvolvimento técnico, científico e cultural. Alguns artistas e pensadores daquele período consideravam que entre a antiguidade e o século na qual viviam existiu apenas uma época violenta, de atraso técnico e cultural e de grande fanatismo religioso. Por isso foi chamado Idade Média.
Essa visão negativista da Idade Média passou a ser desconstruída em meados do século XX, pois o período também foi marcado por grandes manifestações artísticas e culturais. Neste capítulo faremos uma sucinta explanação da Baixa Idade Média, para que apresentem os conceitos básicos para uma campanha em Medievo.
Tema e Tom
Você já assistiu O Sétimo Selo? Um filme onde após dez anos, um cavaleiro retorna das Cruzadas e encontra a sua terra devastada pela peste negra. Com a fé em deus abalada, mediante suas reflexões sobre o significado da vida, quando a Morte surge à sua frente, pois havia chegado sua hora. Desejando ter tempo para as suas reflexões, convida-a para um jogo de xadrez que decidirá se ele parte com a Morte ou não. Tudo depende da sua vitória no jogo e a Morte concorda com o desafio, já que não perde nunca. Em O Sétimo Selo você terá um retrato de qual cenário o Medievo se propõe a simular em suas mesas.
A Baixa Idade Média é um período de predominância da fé, com uma enorme credibilidade social na igreja romana. Acreditava-se em lendas fantásticas, no paraíso terrestre, na pedra filosofal, no elixir da vida eterna, em cidade todas de ouro e afins. existem lendas em que os mares estão assolados por monstros, sobre a terra que terminava de forma súbita por ser plana. toda essa mentalidade reinante se refletiu na forma de escrever a história, no qual há uma grande presença do milagre do maravilhoso e do impossível.
A Baixa Idade Média
Medievo tem como proposta de cenário a Baixa Idade Média para as suas aventuras. Este período se estende do século X ao século XIV e a data simbólica que marca seu fim é o ano de 1453, com a tomada de Constantinopla pelo Império Turco-Otomano. Ela era considerada o apogeu tanto da civilização medieval como da Cristandade.
A historiografia divide a Idade Média em dois períodos: a Alta Idade Média, cujo início se dá na queda do império Romano, que culmina com a estruturação do sistema feudal, a migração para o campo e o fortalecimento do poder da igreja frente à sociedade europeia feudalista; e a Baixa Idade Média, que tem seu início com o movimento das cruzadas e as suas consequências, como a expansão do comércio, o surgimento das corporações de ofício e a reestruturação das cidades medievais.
As Cruzadas
Em 1076 os turcos muçulmanos tomaram a cidade de Jerusalém, e diversas outras províncias que pertenciam ao Império Bizantino, e proibiram a entrada de cristãos na cidade de Jerusalém. Tal fato levou o imperador bizantino, Aleixo I a pedir ajuda ao Papa Urbano II.
O Papa convocou os cristãos ocidentais para uma batalha, em prol da recuperação da cidade santa, e conquistar novos territórios e estender o poder da igreja católica romana até o oriente, e reunificar a fé cristã abalada com a separação da igreja bizantina, em 1054. Para conseguir tal feito, o pontífice necessitaria de um grande exército, para isso garantiu que todos que participassem desta batalha teriam seus pecados absolvidos, e um lugar no céu. As promessas papais foi o motivo para que muitos nobres, abandonassem suas terras e partissem em direção a terra santa, mas não apenas atrás de redenção, muitos foram atrás de dias melhores e de riquezas.
A aliança entre o Papa e o Imperador de Bizâncio arrecadaram os fundos necessários para custear o exército cristão. Onde os mesmos deveriam costurar cruzes em suas roupas, devido a este fato, as expedições passaram a se chamar Cruzadas. A igreja não era a única interessada em financiar os cruzados, muitos nobres que não herdaria nada, pois não eram os primogênitos partiram em busca de riquezas nas cruzadas. Camponeses buscavam terras, comerciantes das cidades de Veneza e Gênova, buscavam novos mercados, e ansiavam pelo monopólio no comércio do mediterrâneo.
Renascimento Comercial
Apesar de não alcançarem seus objetivos, as cruzadas proporcionaram o renascimento comercial e o contato da Europa com o Oriente, onde a mercadoria e o dinheiro circulavam melhor. O que vinha daquela região era em pouca quantidade, mas valia muito. Produtos como pimenta, seda, marfim, gengibre, sal, cravo e outros ficaram conhecidos como especiarias. E, por causa da lei da oferta e da procura (quanto menos produto no mercado, maior seu valor) tais especiarias chegavam a valores extremamente altos se compararmos aos seus preços de hoje.
Os comerciantes viajavam em caravanas pelo mar mediterrâneo ou mesmo por terra levando as especiarias até locais muito distantes trazendo o desenvolvimento, principalmente para as cidades portuárias, já que sua localização ajudava a chegada dos produtos ao continente europeu.
Nesse período começou a surgir os burgos e os reis burgos, um tipo de conjuntos de pessoas que passaram a existir em consequência do crescimento populacional e se localizava em volta do castelo do senhor feudal, pois perceberam que lá, aproveitando-se da proteção que os soldados e grandes muros davam ao castelo, estariam mais seguros em relação aos assassinatos e os saques de suas mercadorias.
O ouro e a prata passaram a ser utilizados em trocas, mas, logo após o dinheiro passou a ter uma importância maior para os comerciantes. Pois, a partir desse intenso crescimento comercial, foi preciso introduzir novamente uma economia monetária.
As Corporações de Ofício
Nas cidades, os burgueses mais poderosos eram representados pelos banqueiros e grande mercadores. A maior parte da população era formada por artesão e pequeno comerciantes. Esses pequenos ramos, da mesma localidade, que produziam os mesmos materiais, decidiram se reunir em corporações de ofícios, eles controlavam a produção, os preços, e o que eram produzidos nas oficinas.
Os donos das oficinas era os mestres de ofício, eles eram proprietários do saber, das ferramentas, e da matéria prima, e os responsáveis pela escolha dos aprendizes, que ingressaram nas oficinas por volta dos 12 anos de idade, e recebia comida e moradia em troca do saber; e a contratação de trabalhadores (jornaleiros) e a fixação dos salários.
O Surgimento da Burguesia
Na baixa idade média, passaram a surgir nas cidades grupos de pessoas que não pertenciam a nenhum conjunto tradicional do sistema feudal. Dedicavam-se a produção artesanal e comércio e não eram servos nem nobres: Os burgueses. As diferentes moedas usadas, o poder descentralizado e os muitos impostos impediam um maior crescimento do comércio. A burguesia queria crescer e acabava sendo parada pelo feudalismo.
Os artesãos perceberam então que precisavam se unir contra a concorrência. Criaram as corporações de ofício para escolher o produto e determinar preços e qualidade deles. Nessas corporações existia um sistema de hierarquia, começando pelo mestre artesão, seguido pelos oficiais que recebiam alimentos e roupas em troca de seus serviços. Os burgueses passaram a apoiar os reis, que com seus poderosos exércitos travaram várias batalhas contra os senhores feudais, que estavam mais fracos desde as cruzadas.
Cultura e Cidade
Gradualmente, as cidades foram se tornando mais importantes e isso não era bom para quem queria manter o sistema feudal, pois as pessoas deixavam as comunidades rurais em busca de mais oportunidades de trabalho. As cidades cresciam muito rápido, e graças a isto as pessoas tornaram-se mais esperançosas.
Nas cidades, os pensadores passaram a ter acesso à obra de Aristóteles, traduzidas pelos Árabes. Começaram então a relacionar a fé com a razão, e isso se refletiu diretamente na ideia de que o homem pode dirigir seu destino de acordo com sua vontade, pois tem livre-arbítrio. Por causa das construções de igreja, a arquitetura foi o movimento que mais se desenvolveu. Dois estilos dominaram essa época: Romântico e o Gótico.
O romântico nos séculos XI e XII, com construções características por terem janelas pequenas, paredes grossas, interiores pouco iluminados, grandes pilastras e arcos redondos. Entre os séculos XIII e XIV, o gótico prevaleceu. As catedrais passaram a ter janelas enormes, elaboradas e coloridas. Eram mais verticalizadas e tinham paredes muito delicadas e finas.
O teatro tinha como base o Velho e o Novo testamento, com ênfase na vida de Cristo, apesar de algumas apresentações terem ar de comédia. Dois tipos de peças existiam: As profanas e a Sacra. As apresentações eram feitas nas feiras, ruas, nos palácios e algumas performances eram desaprovadas pelo clero.A música foi um meio de expressão muito importante na idade média. Cantado por um conjunto de monges, o canto gregoriano era utilizado na liturgia e não era fazia uso de instrumentos. Porém, esse meio artístico não ficou preso apenas às práticas religiosas. Existiam também os cantos profanos, que podiam ser sobre amizade, amor e sofrimento. Eram aceitas apenas as danças de caráter religioso, outros tipos eram desaprovados e proibidos nos templos por causa de sua ligação com a sensualidade. Mas, apesar dessa desaprovação, a dança seguiu como meio de celebração.
Educação e Inquisição
O ensino de valores era o maior objetivo da educação. Esse conhecimento poderia ser obtido de duas maneiras: pela igreja, através de seus ensinamentos e informalmente, pelos adultos. As universidades eram instituições independentes formadas por alunos e professores, onde se estudava de tudo: filosofia, teologia, artes e medicina.
Outros pensamentos circulavam nas cidades da Europa, e a igreja se sentia ameaçada. Então, quem contestava os ensinamentos católicos era perseguido, torturado ou morto. A inquisição, organizada pelo papa Gregório IX era uma instituição de repressão às heresias, funcionava na Alemanha, Espanha, França, Portugal e Itália. Os tribunais do santo ofício, tinha como dever identificar e punir os que não obedecessem a regras impostas pela igreja.
A Peste Negra
Todo o desenvolvimento acelerado trouxe para a Europa uma situação muito complicada causada pela falta de saneamento básico, desnutrição, provocando epidemias como a peste negra, que veio do oriente trazida pelas caravanas. A desnutrição enfraquece as defesas imunológicas dos europeus o que contribui para para o alastramento e morte de forma rápida dos infectados, passavam para os outros através do contato, da tosse, e os ratos. Assim a doença se alojava nos pulmões, causando a morte em poucos dias. Estima-se que a peste matou em torno de 1/3 da população europeia.
A drástica redução demográfica agravou a crise econômica, e a falta de alimentos, gerando miséria e sofrimento no povo europeu, a população culpou os judeus pela doença, que foram alvos de violentos massacres e perseguições por partes dos cristãos. Depois da peste negra que causou um certo afastamento entre aos servos e os senhores feudais. A população ainda estava preocupada com as mortes, porém por outro lado, o sistema feudal estava em declínio pois, os servos tornaram-se cada vez mais autônomos e suas vidas melhoraram. Os nobres queriam seu poder perdido de volta e por isso travaram várias batalhas contra os servos e os reis, por perceberem que o sistema feudal estava desconfigurado, procuram ter novamente seu poder centralizado.
A Guerra dos Cem Anos
Em 1328, Carlos IV, Rei da França, vem a falecer sem deixar herdeiros para o trono, situação que leva Eduardo III da Inglaterra a reivindicar o trono, juntamente com outros nobres, ficando o mesmo com Felipe de Valois, que também era sobrinho de Carlos IV. Além da questão da posse do trono francês, ambos reinos tinham interesses em conflitos sobre determinadas regiões em suas fronteiras, especialmente na região do Flandres, sobre o comércio de tecidos, onde ambos os reinos tinham grandes interesses e influências, sejam no lado produtor (franceses) e no lado dos comerciantes (ingleses).
Em 1337, Eduardo III se proclama rei da Inglaterra e França, aliado a burguesia comercial, iniciando assim um conflito que durou até 1453, com períodos de tréguas e hostilidades, que terminou com a vitória francesa. Tal conflito destruiu os campos, e deixou milhares de mortos dos dois lados do canal, mas o conflito contribuiu para a construção do poder absolutista de ambos os lados.
Revoltas Populares
No campo, a crise econômica e drástica redução demográfica causada pela peste tiveram duas consequências. Primeiro, em algumas regiões os camponeses ocuparam terras despovoadas, e conseguiram escapar da servidão. Segundo, para retomar o controle das regiões, e reforçar os laços de vassalagem, os senhores passaram a cobrar antigas taxas de impostos senhoriais.
A revolta dos Jacques, em 1358, refletia o desespero dos camponeses do reino, que rebelados saquearam e queimaram castelos, além de extinguir famílias nobres, responsáveis pela sua exploração e pobreza. A repressão real ao movimento foi de violência igual, tendo o conflito algo em torno 20 mil camponeses mortos em conflitos.
As tributações também causaram conflitos na Inglaterra, em 1481, ao sul do reino. Grupos rebeldes seguiram para a cidade de Londres onde saquearam e destruíram palácios e prédios públicos, e negociaram uma trégua com o rei, que logo não foi cumprida, e os rebeldes foram punidos com violência e covardia.
Nas áreas urbanas a crise provocou o fechamento as corporações de ofício, e reforçou o poder da burguesia, que reduziu drasticamente os salários dos trabalhadores. Baixos salários e altos impostos, causaram vários levantes populares.
Resultados das Crises
A produção de artigos de luxo foi afetada, dando abertura para a produção de itens mais simples, os camponeses puderam ocupar cargos que ficaram desabitados, comprar lotes de terra, integrar ao clero. Muitos senhores feudais contraíram empréstimos com os burgueses e acabaram arruinados, enquanto a burguesia acumulava riquezas, e apoiava os reis na centralização monárquica, com a contrapartida de unificar pesos, medidas e moedas, e acabar com as taxas de comércio feudais.
Cronologia
1095 - Organização da Primeira Cruzada pelo papa Urbano II.
1118 - Criação da Ordem dos Cavaleiros Templários.1122 - Concordata de Worms: colocou fim a primeira fase da Questão das Investiduras entre o Sacro Império Romano-Germânico e o papado.1163 - Início da construção da Catedral de Notre-Dame de Paris.1231 - O papa Gregório IX institui a Inquisição.1265 - Origem do Parlamento na Inglaterra.1351 - Instituído na Inglaterra o Estatuto dos Trabalhadores, cujo objetivo principal era controlar os salários e o mercado de trabalho no país.1358 - Ocorreram na França várias revoltas camponesas contra a exploração dos senhores feudais. Estas ficaram conhecidas como Jacqueries.1347 - Tem início a epidemia de Peste Negra na Europa.1415 - Os portugueses conquistam a cidade de Ceuta. Tem início o período das Grandes Navegações e descobrimentos marítimos.1337 a 1453 - Guerra dos Cem Anos entre Inglaterra e França.1378 a 1417 - Grande Cisma do Ocidente (crise ocorrida na Igreja Católica).1429 - Joana D'arc comanda os franceses na conquista da liberdade do domínio inglês.1439 - João Gutenberg, inventor alemão, cria o sistema de impressão de textos através dos tipos móveis. É a invenção da imprensa.1453 - Tomada de Constantinopla. Os turcos otomanos invadem e dominam o Império Bizantino (Império Romano do Oriente).
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